O grande homem da escrita – António Torrado – faleceu no passado dia 11 de junho, aos 81 anos, vítima de doença neurodegenerativa prolongada. A literatura portuguesa ficou mais pobre!
Autor de mais de uma centena de obras, António Torrado dedicou a sua vida às letras, nas mais variadas áreas, tendo começado a publicar aos 18 anos de idade. Ao longo dos mais de 60 anos em que escreveu, marcou gerações de leitores de todas as idades, com especial relevo para os mais jovens, para quem escreveu histórias e contos sem fim, cheios de graça e inspiração.
Ficou conhecido como “o escritor que tinha sempre um livro para oferecer”, encantou miúdos e graúdos, trabalhou no teatro, no cinema e na televisão, foi estudante e professor, foi editor e jornalista e um grande nome da literatura infantojuvenil em Portugal.
O Princípio De Tudo
O jovem António Torrado nasceu a 21 de novembro de 1939, em Lisboa. Filho de uma família modesta de comerciantes, estudou Ciências Económicas com a intenção de vir a ajudar no negócio familiar, no entanto acabou por se licenciar em Filosofia pela Universidade de Coimbra. Dedicou-se ainda ao estudo do Direito, mas sentiu-se desiludido pois a arte das leis “dava-lhe sono”.
Escreveu no Diário Popular e n’A Capital. Em 1970, conheceu José Jorge Letria, jornalista no Diário de Lisboa, de quem se tornou grande amigo.
Letria relembra o amigo pessoal “O António andava sempre com uma pasta de cabedal debaixo do braço. Sabe o que trazia? Livros para oferecer, sempre”!
Percurso Do Autor
António Torrado viveu no mundo da escrita e da literatura, tendo cumprido diversas funções ao longo do seu percurso profissional. Sempre de caneta em punho, o autor foi:
- Jornalista
- Poeta
- Ficcionista
- Dramaturgo
- Guionista de cinema
- Argumentista e produtor de televisão
- Editor
- Professor, investigador, pedagogo
- Nome sonante da Literatura Infantojuvenil, dentro e fora do país.
Este grande autor de inúmeras obras literárias foi professor de Matemática e um dos fundadores do Externato Fernão Mendes Pinto, em 1968. Foi dramaturgo residente da Companhia de Teatro Comuna; fundou e dirigiu a Editora Plátano, criou a Editora Comunicação, que se direcionou para a publicação de livros de bolso de apoio aos estudos académicos, e foi produtor e chefe do Departamento de Programas Infantis da RTP, com uma participação de peso na adaptação para português da série americana “Rua Sésamo” – uma série de 440 episódios lúdico-pedagógicos infantis que foram transmitidos pela Radio Televisão Portuguesa entre 1989 e 1996.
A Sua Obra
Nome proeminente da literatura infantil, António Torrado foi o primeiro autor português a ser galardoado com o Grande Prémio Gulbenkian de Literatura para Crianças e Jovens, no ano de 1979. Algumas das suas principais obras são O Rei Menino (1986), Da Rua do Contador para a rua do Ouvidor (1990), O Mercador de Coisa Nenhuma (1994), Teatro às 3 Pancadas (1995), Verdes são os Campos (2002), Histórias à solta na minha Rua (2006), Fábulas Fabulosas (2017), Quarenta e Dois Mais Vinte e Um e Outras Histórias (2020). A sua bibliografia regista mais de 120 títulos, muitos dos quais foram traduzidos em várias línguas. Em 1974 e 1996, livros seus foram incluídos na Lista de Honra do Internacional Board on Books for Young People.
Contador de histórias, acompanhou milhares de crianças nas escolas, na leitura e interpretação das suas obras, através de sessões que realizou com alunos e professores por todo o país. Foi autor de obras de pedagogia e de investigação relacionada com a educação, área a que sempre se dedicou ao longo da sua vida.
António Torrado foi ainda argumentista de filmes e programas de televisão, como A Ilha dos Escravos (2008), Aristides de Sousa Mendes, o Cônsul de Bordéus (2011), O nosso Cônsul em Havana (2019), entre outros.
Questionado, em tempos, sobre os seus temas de escrita preferidos, António Torrado respondeu “Já escrevi sobre tudo e mais alguma coisa”. Considerado como uma marca de relevo na Literatura Infantil em Portugal, António Torrado publicou dezenas de obras para crianças, histórias que fizeram parte das listas do Plano Nacional de Leitura posto em prática nas aulas de Português de todas as escolas portuguesas do ensino básico.
Aquando da sua morte, a Sociedade Portuguesa de Autores publicou uma nota de pesar pelo desaparecimento do escritor e dramaturgo. Na mesma ocasião, a Ministra da Cultura Graça Fonseca relembrou António Torrado como uma “referência incontornável” da literatura portuguesa e uma marca inolvidável em todas as crianças e jovens que partilharam a leitura dos seus livros.
Ainda Uma Luz A Caminho
António Torrado criou até ao fim! Escreveu um último livro no final da sua vida, cujas ilustrações, da responsabilidade de Inês Fonseca Santos, foram finalizadas recentemente. Aguarda-se agora o lançamento desta derradeira obra nos próximos meses. Os leitores dedicados de António Torrado terão, assim, mais uma pérola da sua escrita para compor as estantes e o espírito.